O baixo volume nos reservatórios das hidrelétricas que fez a conta de luz aumentar é apenas uma amostra do que pode ocorrer se o desmatamento no Cerrado seguir aumentando e as emissões de gases do efeito estufa não forem controladas. O Cerrado é considerado um importante berço das águas do Brasil, tão importante para a disponibilidade dos recursos hídricos quanto a Amazônia.
No coração do Brasil, o bioma abriga centenas de rios que são fundamentais no abastecimento da bacia do rio Paraná. No entanto, esses mesmos rios encontram-se em uma de suas menores vazões já registradas na história. A falta de água suficiente ameaça o país de viver um apagão.
Segundo a ONG WWF Brasil, 90% da população brasileira consome energia diretamente produzida no Cerrado ou fornecida por alguma hidrelétrica cujas águas nascem nesse bioma. As águas do Cerrado também abastecem a agricultura e a atividade industrial de boa parte do território brasileiro.
No entanto, o Cerrado segue sendo desmatado. Os últimos dados mostram que, em 2020, 7.340 km2 do bioma foram devastados, o que representa um aumento de 13% em relação ao ano de 2019. Os dados correspondem ao período de agosto de 2019 a julho de 2020. De acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a área em alerta de desmatamento acumulado entre 1 de janeiro e 22 de abril de 2021 já é 32% superior ao mesmo período que o registrado no ano passado.
Cerrado o berço das águas
O engenheiro ambiental e pesquisador Arnaldo José Cambraia Neto explica como o Cerrado auxilia na regulação dos rios. “No Cerrado nascem muitos rios como o São Francisco, Xingu, Tocantins e Araguaia. Esses rios correm o ano todo, embora o Cerrado possa passar vários meses na estação seca sem receber uma só gota de chuva”, explicou.
Cambraia Neto esclarece que a vegetação do Cerrado desenvolveu raízes longas e ultrarramificadas para buscar água nas profundezas e retirar nutrientes dos solos naturalmente pobres da região. “As raízes de uma árvore do Cerrado se entrelaçam com as das plantas vizinhas, formando uma espécie de rede, sendo comparada à uma esponja debaixo da terra. Na estação chuvosa, esta esponja encharca e permite que a água infiltre até depósitos subterrâneos, os lençóis freáticos e aquíferos. Já na estação seca, essa esponja retém a umidade no solo, garantindo a sobrevivência das plantas e dos animais que delas dependem”, disse.
São esses depósitos que alimentam as nascentes dos rios, garantindo que eles continuem fluindo mesmo quando as chuvas cessam. “Pelo menos 80% da água dos rios do Cerrado tem origem subterrânea. Ou seja, ela vem principalmente da chuva que infiltra no solo e, percorrendo os sulcos criados pelas raízes, consegue chegar aos lençóis freáticos e aquíferos”, esclareceu Cambraia Neto.
A manutenção da vegetação natural do Cerrado é fundamental para garantir a continuação do ciclo das águas. “O solo seca, a capacidade de armazenar água diminui e a quantidade de água disponível tanto para a região do Cerrado quanto para o restante do Brasil vai diminuir”, afirmou.
Como solução, Arnaldo aponta a importância de se respeitar o Código Florestal vigente e de diminuir a emissão de gases que causam o efeito estufa. “O Código Florestal deve ser respeitado, pois prevê a conservação de áreas de preservação permanente, como por exemplo as matas de topo de morro e ciliares, que contribuem para a preservação dos recursos hídricos. Também é importante a elaboração de planos diretores para as bacias hidrográficas para que elas sejam ocupadas de forma racional. Outra ação importante e em escala mais global é minimizar ao máximo a emissão de carbono para reduzir os impactos das mudanças climáticas no meio ambiente”, finalizou.
O Rio São Francisco possui cerca de 90% de suas nascentes localizadas no Cerrado, que abriga cerca de 55% de seu leito. As áreas desse bioma também são grandes fornecedoras de recursos hídricos para outras localidades. Das 12 importantes bacias hidrográficas do Brasil, oito têm as nascentes no Cerrado.
Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Luiza Baggio